O POBRE E UM BANCO DE JARDIM
Um pobre solitário, arrastando-se sobre as pernas cansadas, entrou no jardim e estacou em busca do banco, onde habitualmente se deitava. Rasgou um sorriso ao vê-lo ali mesmo na sua frente – exclamou triunfante - Amigo Banco, como folgo olhar-te com uma nova cor decorado. Tenho passado por aqui, mas, o meu lugar estava sempre ocupado!
- Pudera...estava todo desbotado e ressequido do tempo. Agora estou vestido de verde e encarnado, para lembrar o Natal! – Comentou o Banco acrescentando - E os meus pés? hum...É melhor me calar… tão feios e enferrujados! … Alguns que por aqui passavam escarneciam do meu ar cinzento, pontapeavam-me até fazer o pino. Outros, já me viam, com o olhar enfastiado!
- A quem o dizes, companheiro, – confessou - estou velho e encovado, nem com muita tinta pintado disfarçava os meus oitenta e tal… - Ai, ai … O que mais dói são as dores da alma!
-Oh velhote diz-me aí! O que são as dores da alma? – Indagou.
- Tens razão! - És filho de uma árvore. Elas sentem dores físicas; se lhes arrancarmos os ramos, se as cortamos, ou se as inundarmos com matérias nocivas, contudo, alma não têm.
- Nós, seres humanos; temos alma, e dores que não se vêem, sentem-se, quando o sangue fala mais alto, corre nas veias magoado, e faz estalar o coração.
-Ah! – Exclamou assombrado - A alma faz isso?!
- Se faz! … O meu amigo, no fundo é um felizardo! Não tens mãe porque morreu; não foste marcado pela vida, nem pela família esquecido… isso são coisas da alma!
- Pois… dores dessas, não sinto… - Interrompeu num brado!
-Sobrevives sem alimentos; vestir, calçar ou tomar remédios, e o pior é, onde arranjar dinheiro para os comprar! E o tédio que cresce, quando o dia teima em não querer acabar?! - Insistiu este.
-Dizes bem, velhote. E… o tédio, o que é?
-Oh Banco… Tens lá horas que te sobrem? Ouves e vês tudo o que te rodeia; tens a natureza que te dá a noite, a lua, as estrelas e a luz do sol que irradia em ti as cores das árvores frondosas que te envolvem… - Como saboreava estes momentos! … Acolhes todos os que em ti se acomodam; as crianças que se sentam no teu colo, os namorados que se beijam – Ah! … Que saudades… E as pessoas que como eu, se contentam em repousar o corpo e os olhos… Já viste que até um cão vadio se enrosca em ti se está frio?! - Era feliz então, quando podia ajudar os outros… - Bramia o pobre de lágrima no olho.
-Então velhote, quer dizer, que eu sendo apenas uns bocados de pau, sou mais feliz que tu!?
É isso mesmo. Porém, eu sei que vou deixar de sofrer… Os sonhos, que acalentei, hão-de realizar-se brevemente!
- Ah… E os sonhos? … – Murmurou o Banco.
-Sabes, eu sonhava todas as noites com um anjo que me vinha buscar. Tanto sonhei… que Jesus apareceu uma noite de luar. Leu-me a alma e disse: - “Queres ir para um bom lugar, após o meu aniversário em 25 de Dezembro, voltarei para te levar.” - Disse o pobre com a voz embargada - Por isso, estou aqui hoje, para me despedir de ti, que foste, um bom amigo.
-Oh velhote será que não vais precisar de levar um banco?! …
-Ah! … Jesus deixou um recado para todos. “Os que quiserem ir para um bom lugar, terão de espiar na terra”, e tu, não tens nada para espiar, nem alma para salvar - Declarou o idoso.
A partir daquele dia, o idoso jamais foi visto no jardim. No entanto, o banco permaneceu no mesmo lugar, esperando a chegada de quaisquer outros Velhotes - dos muitos que povoam a terra - que quisessem com ele conversar.
Raízes M/ Peniche