"Mágica Maresia"
Só podia sentir o vento. A inércia e completo abandono em si nem lhe faziam sentir a agrura do Inverno. Maior que a tempestade era a dor que sentia no seu peito.
Perdida de si mesmo, cambaleou até àquela muralha onde tantas vezes fora feliz nas suas brincadeiras de infância. Outrora, em tempos já longínquos, fora pirata, bruxa má, dona de casa e tantas outras coisas de criança que nos levam a construir um mundo feliz. Agora aproximava-se da sua extremidade, do seu precipício, onde, justamente vivera alegria e sonho, expectativa e esperança. Os sons diziam-lhe segredos revoltos e salgados que só dos verdadeiramente livres podem ser ditos.
As agruras da intempérie nada eram, perante a sua vulnerável e tumultuosa existência. Queria acabar com tudo. Desejaria renascer ou simplesmente deixar de ter nascido. Emergiram-lhe à memória, as palavras de seu pai, em noite de tempestade, quando, aterrorizada o chamou ao seu quarto, por não conseguir dormir.
- Pai! Tenho medo! Está muito barulho lá fora!
- Filha não temas. Isto vai passar!
- Não gosto de tempestades.
- Sabes, por vezes temos que passar por elas.
- Porquê?
- Então filha? Como poderíamos valorizar um belo dia de Sol? Como seria se as coisas não se renovassem? Além disso depois de um mau momento vem sempre um melhor.
Esse momento nunca tinha chegado. O seu Pai tinha partido deixando a promessa de estar sempre consigo. A família tinha naufragado na vida. Só lhe restavam as lembranças de dor e traição. Os seus sonhos não apaziguaram o seu ser, vinham embrulhados em maresia avivando e fazendo sangrar ainda mais as já grandes feridas.
Aproximou-se ao máximo. O barulho do seu coração confundia-se com o som violento do vento. Já nada tinha. Só o vento!
- Pai. Vou ao teu encontro. Sinto saudades de tudo o que perdi. Perdoa-me.
Um forte som, das ondas, surgiu ainda mais enaltecido. Vinda do meio do nada uma mão que se estendeu na sua direcção. Uma voz reconfortante suou-lhe ao ouvido.
-Vem. Toma o meu caminho. Tudo tem solução. Tudo tem retorno.
Eu nunca te abandonarei…
Eu nunca te abandonei…
Estou aqui!
O som já não existia, só a névoa e uma leveza pela qual nunca, antes, passara…Talvez fosse sonho…Talvez o cumprimento de uma promessa…
Paulo Gonçalves
Um conto que está fabuloso.
ResponderEliminarlindo
ResponderEliminarMuito bom.
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